segunda-feira, 30 de abril de 2012

Fluxo

Os desafios que se colocam à educação na era contemporânea têm de ser respondidos por indivíduos dispostos a investigar e a equilibrar novas soluções com as transientes imposições tutelares. A sociedade contemporânea global, sob ameaça ambiental, de conhecimento, assente em novos modelos económicos e em rede requer cidadãos informados e capazes de gerir as exigências dos fluxos de mudanças. Criatividade é um dos componentes essenciais das competências necessárias à resposta a estes desafios.

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Realidades Mistas I

Esta animação funciona como cenário animado para exposição temática sobre biodiversidade. Em vez de imagem fixa, porque não movimento? Os alunos do 5º C utilizaram o Bryce 5.5 para criar os cenários, animados no Bryce 7.1. Edição vídeo em Vegas Movie Studio e sons ambientes descarregados no Freesound.

A Wizard Of Earthsea

Ursula K. LeGuin (2004). A Wizard Of Earthsea. Nova Iorque: Bantam Books.

Não há volta a dar. Decididamente fantasia épica com toques mágicos e medievalista não é para mim. Não que isso se deva à leitura deste livro. É apenas um tema que pouco me diz. Apesar disso, dei por mim a gostar deste primeiro livro da série Earthsea.

Le Guin é uma das grandes escritoras do género FC e fantasia e este livro escrito em 1968 mostra-o. A construção de um mundo fantástico, palco imenso de aventuras descritas e sonhadas, é impecável. O sentimento de espaço aberto e de possibilidades infindas é enorme. O mundo de Earthsea é vasto, e neste livro a autora leva-nos a conhecê-lo através de um périplo duplamente iniciático através de uma história de rito de passagem do principal personagem e iniciação do leitor às intricacias deste universo de fantasia.

Ged é um jovem feiticeiro, marcado pelo destino. Acompanhamos o seu crescimento enquanto ser desde a latência dos seus talentos até ao confronto inevitável consigo próprio, simbolizado pela luta com uma sombra inominável que libertou num acto de irresponsabilidade descuidada. Este percurso que mostra-nos que o personagem será algo de importante, indivíduo profundo e inquieto que equilibra deveres, poderes e vontade de ir mais além. É, no fundo, aquilo que todos desejamos ser. As aventuras literárias são uma metáfora do processo de formação individual que todos atravessamos, de melhor ou pior maneira. Todos temos de confrontar as nossas próprias sombras para nos tornarmos indivíduos completos.

A Wizard Of Earthsea utiliza magistralmente os elementos narrativos do género. Visitamos uma terra ancestral numa era difusa que nos leva a imaginar um passado mítico. A autora entretece uma eficaz teia mitológica exclusiva do universo ficcional e socorre-se dos lugares comuns do género para gizar os seus contornos. Aldeias rurais, cidades vibrantes, povos com características únicas, espaços semi-selvagens onde a floresta impera, a dualidade entre aristocracias reinantes e o lumpen isolado nos seus espaços e, claro, magia. Incantações, filosofia e o poder de quem detém o conhecimento das maquinarias que fazem girar o mundo.

Para quem não se sente atraído pelo género, este é um bom livro para o ficar a conhecer melhor. Escrito com mestria, leva-nos a um vasto e bem traçado mundo de fantasia, mostrando-se como obra marcante da literatura do fantástico.

domingo, 29 de abril de 2012

Alegria



Uma pontinha de orgulho profissional, enquanto os alunos vão terminando o trabalho Pintar as Emoções.

Dream on...

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Fluxos

That is not dead which can eternal lie,
And with strange aeons even death may die 

H.P. Lovecraft, The Call of Cthulhu

Apontamentos Urbanos




Olhar para os elementos esquecidos da paisagem urbana. Beleza na serendipidade. Vislumbres que tocam a memória e dão algo em que pensar. Pausas visuais nos percursos pedestres pelos traçados arquitectónicos.

Fluxos

In our deep vaulted cell
The charm we'll prepare,
Too dreadful a practice
for this open air.


Henry Purcell, Dido e Eneias.

sábado, 28 de abril de 2012

À Feira

Fui à feira do livro e... vim de lá com uma grande molha. Confesso que o primeiro salto à edição deste ano me deixou desencantado. Algo na Feira do Livro se parece cada vez mais com feira do que com livros. Ao chegar contaram-me que nos stands de uma das grandes editoras havia um concurso de corridas com livros. Boa parte dos stands eram de comes e bebes, e gostei particularmente dos dedicados a gelados e granizados que tão bem sabem nestes dias frios e chuvosos. Livros há, como sempre ouve, mas durante a visita era impossível não reparar em gente solícita que ia oferecendo amostras de pacotes de sopa em pó, comida para gatos ou cereais de pequeno almoço. Dois stands destacavam-se dos restantes, pelo pormenor de terem portais de controlo rfid e segurança nas entradas. Num destes, da mega-editora leya, o ambiente de supermercado em promoções era tão pronunciado que seria desculpável a um visitante mais descuidado não reparar que nas estantes estavam livros.
Diga-se que o dia fresquinho pontuado por chuvadas torrenciais estava convidativo a um passeio pela feira ao ar livre. Especialmente para quem é avesso ao chapéu de chuva como eu.
Talvez eu tenha uma ideia demasiado romântica de silêncio monástico e reverência perante os livros e literaturas. Afinal o livro também é negócio, e nada de mal há nisso. Mas este exagero, esta acentuação no marketing desbragado aliada à falta de atenção aos públicos é um tiro no pé da promoção de leitura. Feira ao ar livre agendada para dias de mau tempo? Bombos a rufar e assédio de ofertas promocionais de comida de gatos? Corridas com livros e outras actividades do género? Desculpem lá, mas o que é que isto tem a ver com a feira do livro? O que aconteceu àquele espaço tranquilo onde uma vez por ano os bibliófilos e o público em geral iam ver novidades e rebuscar atenciosamente preciosidades e obras esquecidas? A febre da monetização vai altíssima.
Pelo menos ia em boa companhia. Mas caveat lector: visitar a feira acompanhado de um escritor de FC é duro. Tantas boas indicações de leitura e uma carteira tão vazia...

Será boa altura para confessar que a minha mais antiga e querida memória da feira do livro é a de ter lá ido quando criança, numa visita com a minha turma da escola primária? Trouxe de lá um livro, cujo conteúdo e título já esqueci, mas cujos desenhos me ficaram gravados na memória. Tal como os cinquenta escudos de preço.

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Não, obrigado.

Glitch não intencional. Retirando um c as palavras adquirem outros significados...

Bons exemplos

Exemplos edificantes para a pequenada. Do Ninjettes, comic off-shoot do Jennifer Blood de Garth Ennis que apesar de medíocre tem alguns momentos de brilhantismo. Com este.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Legion of Monsters

Dennis Hopeless, Juan Doe (2012). Legion of Monsters. Nova Iorque: Marvel Comics.

Misturando personagens sobrenaturais do catálogo da Marvel, esta série distingue-se pelo grafismo arrojado que não se parece enquadrar no estilo a que a editora nos habituou. A narrativa é linear e envolve uma caçadora de monstros que forma uma aliança com Morbius, o vampiro vivo, líder de uma força policial que tenta dar ordem a uma enorme sociedade subterrânea habitada pelas criaturas da escuridão nocturna. Cheio de acção, a série leva-nos ao desvendar das causas de um vírus que afecta criaturas sobrenaturais tornando-as mais monstruosas do que originalmente são. Previsivelmente, tudo se conclui num final relativamente feliz. Divertido mas sem ser extraordinário, Legion of Monsters beneficia de um traço e cores fortemente expressivas que deixam de lado algum realismo e a estética tradicional do género.

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quinta-feira, 26 de abril de 2012

Fluxo


Os nossos dias fogem tão rápidos como água do rio
ou vento do deserto.
Entretanto, dois dias me deixam indiferente:
o que passou ontem e o que virá amanhã.

Omar Khayyam, Rubaiyat.

Video-olho.

Novas formas de se olhar a si próprio. A testar uma videoconferência entre escolas apontei a webcam para o ecrã do computador. Quem estava do lado de lá viu-se a si próprio na imagem. Seguiu-se o delírio.

Foundation and Earth

Isaac Asimov (2004). Foundation and Earth. Nova Iorque: Bantam Books.

Dos livros da série Fundação que tenho vindo a ler, este, originalmente publicado em 1984, é o que me desperta uma reacção mais contraditória. Se nos leva a adensar a cosmologia do universo ficcional das obras, deixa quase totalmente de lado o vasto tabuleiro de jogo que caracteriza a série e acaba por parecer uma forma algo amarfanhada de interligar o universo de Fundação com outras vertentes da obra de Asimov.

Foundation and Earth inicia-se onde termina a obra anterior e o seu mote é o desvendar do mistério que acaba por dominar os principais personagens de Foundation's Edge: a busca pelo berço ancestral da humanidade, o planeta Terra. Não é uma demanda simples. A localização do planeta foi perdida, esquecida e deliberadamente apagada dos registos das civilizações que abarcam a galáxia. Apenas restam informações díspares em mitos e superstições, pequenos indícios que levam o triunvirato de personagens que dominou o livro anterior a uma viagem pelos locais ocultos da galáxia. Tarefa simples graças a um artifício narrativo que coloca nas suas mãos uma nave avançada com um sistema revolucionário de propulsão capaz de se deslocar numa fracção de tempo do utilizado pelas restantes naves espaciais. Artifício que funcionou bem em Foundation's Edge, mas que soa demasiado... artificial (passe a expressão) neste livro.

As aventuras acabam por se desenrolar como se o livro fosse uma daquelas incongruentes séries televisivas de FC em que em todos os episódios os heróis enfrentam novas ameaças sempre em diferentes planetas. Em busca da localização da Terra os personagens descobrem e visitam mundos ocultos na galáxia, cuja colonização data dos primórdios da expansão humana. Os mundos encontrados são metáforas patológicas do destino humano. Um encontra-se em dissolução ecológica, com a humanidade extinta e entregue a matilhas de cães. Outro é o paraíso dos solipsistas, habitado por um género humano que vive isolado em vastas propriedades, evoluiu para o hermafroditismo e preza tanto a individualidade e isolamento que recusam o contacto entre si para mais do que o estritamente necessário, e mesmo assim apenas por via remota. O terceiro mundo recorda o futuro distante de A Máquina do Tempo de Wells, com as ruínas de uma civilização avançada cobertas de musgo. O último é um paraíso arcádico na orbita de Alpha Centauri cujos habitantes não hesitam em infectar estranhos com vírus mortais para se manterem ocultos do resto da galáxia. Solipsismo, isolacionismo e decadência reforçados até ao eventual assassínio de estranhos que por acaso ou curiosidade se deparem com as costas malditas destes mundos que optaram por se isolar do resto da humanidade.

No final do périplo encontra-se o graal planetário, o berço da humanidade. É uma desilusão para o leitor, que talvez imagine que Asimov nos reserve para a sua visão de futuro longínquo uma futura Terra habitada por sábios e evoluídos humanos, anciães galácticos que debaixo dos plácidos céus azuis e rodeados dos artefactos que preservam a memória da imensa história observam os netos espalhados pela galáxia. Mas o autor não segue esse utópico caminho, mostrando-nos um planeta inacessível debaixo de radioactividade e um segredo oculto sob as crateras lunares.

É nesta revelação final que cai mais um elemento que desilude. Essencialmente Asimov tenta interligar o mundo de Fundação com outras das suas obras, particularmente as séries sobre robótica, com um novo personagem. Um robot literalmente milenar com capacidades psiónicas, que revela que tem estado a tentar influenciar a história galáctica através dos milénios e atrai os personagens do livro à Lua para desvendar o destino final da humanidade: evoluir para uma galáxia sentiente capaz de se expandir no universo e evitar possíveis invasões de civilizações extra-galácticas. É uma intrigante premissa, certamente inspiradora de épicas space operas, mas que após todo o brilhantismo de múltiplos significados, intrigas intricadas e evolução humana como um enorme jogo de xadrez que caracteriza a série Fundação este final a tentar interligar narrativas díspares soa como um corpo estranho enxertado à força.

Foundation and Earth é, dos livros da série que já li, aquele que parece mais forçado. Abandona os grandes temas deste universo ficcional e centra-se na busca de um berço ancestral da humanidade mas a demanda parece forçada, casual e demasiado dependente de artifícios narrativos. Os personagens e ambientes ficam-se pelos estereótipos, longe da fluidez imaginativa das obras anteriores e o infodump reina. Ao invés de conclusão, fica-se como um enxerto que tenta ligar diversos universos ficcionais do autor. Ou então fui eu que fiquei traumatizado com o futuro distópico do planeta Terra.

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quarta-feira, 25 de abril de 2012

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Processos de databending aplicados ao ícone de uma revolução cujas melhores conquistas - melhoria social de um país e combate à desigualdade, estão como nunca sob fogo cerrado.

The Clockwork Girl

Sean O'Reilly; Kevin Hanna (2008). The Clockwork Girl. Los Angeles: Arcana Studio.

Uma história simples, destinada a um público infanto-juvenil, variação steampunk da estrutura narrativa de romeu e julieta (ou piramo e thisbe, para os mais clacissistas). Dois cientistas rivais e as suas criações, um rapaz selvagem e uma rapariga animatrónica, que descobrem a força da união e da amizade através do amor comum pela ciência. Um comic simples acompanhado por ilustrações elegantes e emudecidas.

terça-feira, 24 de abril de 2012

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Ghost in the machine

A editar curvas de luminosidade de uma fotografia no gimp dei com isto. Será que tenho fantasmas na máquina?

Foundation's Edge

Isaac Asimov (1991). Foundation's Edge. Nova Iorque: Bantam Books.

Este é um livro curioso na série Fundação, originalmente publicado em 1982. Termina quase da mesma forma como se inicia, revê alguns dos pressupostos fundamentais da série e é um romance. Os primeiros livros da série contavam as histórias da Fundação através de contos longos. Este quarto volume quebra essa formalidade e avança com uma narrativa longa, complexa e centrada num só arco de acontecimentos.

Uma das coisas que observei ao longo da série foi uma visão algo draconiana da forma como Asimov via a necessidade de liderança das sociedades, com uma noção de progresso através das acções de líderes esclarecidos que vêem para lá das necessidades contemporâneas expressas. Subjacente está a crença na ciência como algo acima da visão dos indivíduos comuns e uma ideia de poder alicerçada numa certa bonomia ditatorial. Outro pormenor é a sujeição dos indivíduos às grandes forças que modelam o curso do devir histórico. Neste romance, surpreendentemente, é o contrário que é defendido. As lideranças utópicas são expostas como demasiado agarradas a necessidades mesquinhas e os momentos decisivos são deixados nas mãos de indivíduos que estão fora das correntes de pensamento.

Foundation's Edge leva mais longe a história das duas fundações que funcionam como o repositório da luz do conhecimento numa galáxia após a queda do império que a unificara. Asimov coloca o que são essencialmente duas faces de uma mesma moeda em confronto directo. Apercebemo-nos que a ciência tecnológica e a ciência psicológica das duas Fundações se complementam, mas essa visão escapa aos intervenientes. O confronto torna-se inevitável e até desejável pelas lideranças, mas um terceiro factor entra em jogo.

Os conflitos entre as duas fundações, um jogo de gato e rato de manobras secretas, levam duas personagens a vaguear pela galáxia ostensivamente em busca do elusivo berço primordial da humanidade, o esquecido e de localização ignorada planeta Terra. Encontram, ou mais precisamente são levados a encontrar, aquilo que de facto é uma terceira via na evolução da galáxia. Em busca do planeta original deparam-se com o mistério de um planeta consciente.

Em oposição à frieza científica das Fundações Asimov leva-nos até à harmonia natural de Gaia, planeta vivo onde todos os seres se encontram em sintonia e fazem parte de uma consciência colectiva embora mantenham a sua individualidade. Misturando um pouco das suas séries sobre robots com o universo de Fundação, Gaia é um artefacto que sugere a mistura de inteligência artificial avançada com uma visão hippie da humanidade em comunhão com a natureza. Chega até a propor-nos a ideia de um refúgio seguro para humanos construído por robots, que deixa no ar mais como mito criador do que componente da narrativa.

O duplo confronto altera-se com este terceiro elemento. A decisão da obra está na escolha de uma de três vias hegemónicas: o militarismo da Fundação tecnológica, a ditadura benevolente da Fundação psicológica, ou uma utopia evolucionária assente na expansão das consciências planetárias até a própria galáxia atingir a consciência. E é aqui que o livro termina quase como começou. Após a decisão, quase todos os intervenientes se afastam sem se recordarem dos acontecimentos marcantes. As duas fundações continuam os seus percursos olvidadas uma da outra. A forma como Asimov cria conspirações dentro de conspirações, jogos duplos e diferentes camadas é uma das marcas da série. Quanto ao destino final da galáxia, é sugerido que está dependente da resolução do mistério da localização do berço primordial da humanidade.

Obra intrigante, Foundation's Edge tira o tapete ao leitor e altera as expectativas sobre a série. O próximo passo é ver o que o autor nos reserva na busca pelo ponto inicial da expansão humana pela galáxia mítica. A revisitação de Decline and Fall of the Roman Empire já se encontra ultrapassada e Asimov encarreira-nos para um certo arthurianismo onde o planeta Terra funciona como um graal cósmico, cuja demanda molda os destinos dos personagens.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

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Oito variações editadas no audacity, trabalhadas no gimp em camadas. À oitava o gimp decidiu ser cubista. Serendipicidade estética digital...

Kit do Mar





Chegou hoje mais uma boa notícia. A inscrição no concurso Kit do Mar foi bem sucedida para lá das expectativas. Fomos seleccionados para o concurso/exposição e ainda indicados como uma das cinco melhores equipas do escalão 2º Ciclo. Concorremos com um vídeo que documenta a instalação O que está no Fundo do Mar e é com uma certa surpresa que observamos esta escolha para a categoria das cinco melhores equipas, porque o trabalho não foi desenvolvido especificamente para este concurso e a inscrição aconteceu um pouco por acaso... isto não seria possível sem o esforço dos alunos e professores envolvidos. E agora... preparar apresentações.

(não está em meu nome. a coordenar ficou a professora que lançou a ideia da instalação e se lembrou do concurso. uma forma de dar crédito a quem o merece.)

Alone Together

Sherry Turkle (2011). Alone Together. Nova Iorque: Basic Books

À primeira vista, este livro parece um contra-senso. Afinal, não foi Turkle a brilhante investigadora do MIT que no fascinante A Vida no Ecrã mapeou pela primeira vez a relação humana com os à época novos espaços digitais, sublinhando uma crença fervente que as possibilidades de desenvolvimento pessoal se expandiam no contacto do indivíduo com o ciberespaço? Foi esta a obra que primeiro nos alertou para novas formas de estar advindas da comunicação por meios digitais. E agora, passados cerca de vinte anos, o seu discurso parece ter-se alterado radicalmente com um profundo alerta dos perigos desumanizantes das tecnologias que abraçámos.

Alone Together é uma obra de reflexão investigativa que se alicerça nas percepções da autora e em dados obtidos em inúmeros trabalhos de campo. O que emerge é um retrato crítico da influência da percepção da tecnologia sobre a forma como os indivíduos se relacionam nos espaços reais e digitais.

O livro está dividido em duas partes. Na primeira, Turkle está na bleeding edge da investigação sobre os efeitos sociais da robótica, que começa agora a dar incipientes passos como tecnologia de consumo. Ficamos deslumbrados com os robots que aspiram casas, mas os proponentes das aplicações de robótica olham mais longe, para um futuro próximo em que a máquina seja uma companheira do ser humano.

Se há uma fímbria reduzida que procura companheirismo sexual robótico (herdeiros modernos das evas do futuro de L'Isle Adam e das Olímpias de Hoffmann) as suas principais utilizações estão no acompanhar dos elementos mais frágeis - crianças e idosos. Já existem nos mercados brinquedos robóticos e protótipos de máquinas desenhadas para confortar, e os investigadores tentam projectar robots capazes de responder às necessidades básicas. O que Turkle faz é pegar nestes mecanismos e soltá-los em lares de terceira idade e infantários. Os resultados amedrontam-na. Observa uma forte tendência dos utilizadores para animar a máquina, dotando-a de afectos e de uma centelha de vida que na verdade não tem. Considera atemorizador ver que somos capazes de projectar emoções num simulacro inanimado com mais entusiasmo do que aquele com que nos relacionamos com os indivíduos que nos rodeiam. Esta relação calorosa entre o homem e a máquina é uma constante desde que Weizenbaum descobriu o deleite que os utilizadores tinham em conversar com um chatbot que simulava inteligência.

Noutra vertente investigativa, Turkle analisa os nossos comportamentos de comunicação através de novas tecnologias, quer de redes sociais quer de uso de telemóveis. Aqui observa o inverso do que determinou ao olhar para a relação homem-robot, com um conformar do eu real às necessidades de uma persona online, o fascínio patológico com formas pobres de comunicação, por isso mesmo menos tocantes na alma, e a incapacidade de gerir as exigências da comunicação à distância em tempo real com as necessidades da presença física.

Turkle examina cuidadosamente este paradoxo de um investimento mais profundo de humanização com artefactos que simulam vida em contraste com a desumanização das relações entre indivíduos. E pergunta-se, legitimamente, se estamos a seguir o melhor caminho. Mas a sua conclusão não é uma inversão do entusiasmo com novas identidades digitais dos tempos de A Vida no Ecrã. Antes, é uma observação que está na hora de perder o deslumbramento com as tecnologias, amadurecendo no seu uso. Não advoga um regresso a tempos dourados pré-digitais, mas recorda-nos que estamos a esquecer a principal razão para comunicarmos: chegar ao outro. Ao olhar para os indícios de relacionamento entre humanos e simulacros robóticos, observa que essa necessidade se degrada quando o outro é um mecanismo programado de acordo com as nossas vontades, protegendo-nos dos choques emocionais violentos que nos fazem crescer enquanto pessoas. Daí o titulo deste livro. A solidão acompanhada, mediada pelos interfaces tecnológicos, degradadora da riqueza da identidade humana. Este é talvez o mais profundo e tocante livro que li nos últimos anos.

domingo, 22 de abril de 2012

Just a Pilgrim

Garth Ennis, Carlos Ezquerra (2009). Just a Pilgrim. Runnemede: Dynamite.

Garth Ennis mistura fanatismo religioso e aventura pós-apocalíptica num comic rigidamente estruturado. Utilizado a estrutura narrativa clássica do personagem que atravessa vastidões a ministrar justiça na ponta da espingarda, Ennis dá-nos algo que não é inesperado nem assenta em conceitos inquietantes, mas que nos surpreende por uma certa visceralidade e uma curiosa indefinição de papeis. Nunca percebemos se o peregrino é um herói ou um anti-herói com as suas acções violentas, métodos macabros e actos de redenção.

O traço sólido e rústico do veterano Ezquerra confere às paisagens pós-apocalípticas dos desertos que foram outrora o fundo dos mares uma estética rude que se harmoniza com a virulência do argumento.

J. G. Ballard

4. Ballard’s use of the word “chronograms” is another oddity. Merriam-Webster defines a chronogram as an inscription, sentence or phrase in which certain letters express a date or epoch. The multiple-exposure studies of movement taken by Etienne-Jules Marey (1830-1904) are called chronophotographs. In a section of The Atrocity Exhibition titled “Marey’s Chronograms,” a few pages after the list of terminal documents, a character called Dr. Nathan refers to the Marey images assembled by Travis, noting that “the walking figure, for example, is represented as a series of dune-like lumps.” This is the picture shown here: a man in a black outfit marked with a white strip walks along next to a black wall, 1883.

J. G. Ballard, The Art of Fiction No. 85

"Presumably all obsessions are extreme metaphors waiting to be born."

"Sometimes I think that all my writing is nothing more than the compensatory work of a frustrated painter."

"Well, before starting Crash, for example, in 1969, I staged an exhibition of crashed cars at the New Arts Laboratory in London—three crashed cars in a formal gallery ambience. The centerpiece was a crashed Pontiac from the last great tail-fin period. The whole exhibition illustrated a scene from my previous book, Atrocity Exhibition,* where my Travis hero stages a similarly despairing exhibition. What I was doing was testing my own hypotheses about the ambiguities that surround the car crash, ambiguities that are at the heart of the book. I hired a topless girl to interview people on closed-circuit tv. The violent and overexcited reaction of the guests at the opening party was a deliberate imaginative overload which I imposed upon them in order to test my own obsession. The subsequent damage inflicted on the cars during the month of the show—people splashed them with paint, tore off the wing mirrors—and at the opening party, where the topless girl was almost raped in the rear seat of the Pontiac (a scene straight from Crash itself), convinced me I should write Crash. The girl later wrote a damningly hostile review of the show in an underground paper."

"The young people of Western Europe since the sixties have grown up in a remarkably uniform environment, both in terms of the postwar architecture of high-rises and motorways and shopping malls, and also in terms of fashion in clothes and pop music, beach holidays in Spain and Greece, and their attitudes to society as a whole and their place in it—to the place of Europe between the two superpowers (both of whom, the U.S.A. and the U.S.S.R., are tolerated but not trusted). I think for the first time in Western Europe, one sees a generation which finds itself living in sane, just, and largely humane societies—the welfare-state social democracies west of the Iron Curtain—and is deeply suspicious of them, while in fact sharing all the values for which those societies stand. Young people who take for granted that the state will provide free university education, free medical treatment, and prosperous consumer-goods economies, but who nonetheless seem to suspect that behind all this lies some unseen conspiracy. "

"perhaps psychopathology should be kept alive as a repository, probably the last repository, of the imagination. "

The Paris Review | J. G. Ballard, The Art of Fiction No. 85

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